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O que escondem os oceanos? Mitos, medos, curiosidades e fatos sobre o maior ecossistema do planeta

Atualizado: 5 de nov. de 2021

Autor: Humberto Freitas de Medeiros Fortunato


Imagem com vista para o Oceano Atlântico na parte inferior com pequenas ondas e na parte superior o céu azul com nuvens brancas

Fotografia tirada em alto mar, nos parrachos de Maracajaú, Rio Grande do Norte. O registro foi realizado em abril de 2016 durante uma expedição para o estudo da diversidade de esponjas marinhas (TAXPOmol Biodescoberta). Foto: Humberto Fortunato ©, 2016.



Desde as histórias mitológicas gregas até as descobertas científicas mais recentes, como a existência de grandes depósitos de água doce abaixo dos oceanos, que podem servir como uma futura fonte de água potável, tudo o que se refere ao mar parece grandioso, fantasioso, e até mesmo aterrorizante. Fato é que, até hoje, menos de 10% dos nossos oceanos são conhecidos em detalhe pelos cientistas, sendo o solo da Lua mais conhecido do que o fundo marinho.


Oceano vem do grego Okeanós, que na mitologia grega era um titã que personificava o envolvimento de um rio universal que se estende por todo o planeta, com poder de fonte e origem de toda a vida. Hoje, sabemos que cerca de 70% da superfície terrestre é coberta por água, o que corresponde a mais de 97% de toda a água da Terra! A classificação de oceanos, mares, golfos, baías, entre outros, está diretamente relacionada com a proximidade destes aos continentes, a profundidade, a extensão, entre outras características físico-químicas.


Além de “gigante pela própria natureza”, os oceanos são o berço da vida na Terra e os principais responsáveis pela sua manutenção. A partir de uma colaboração científica mundial, provou-se que o ecossistema marinho abarca a maior diversidade de espécies do planeta (cerca de 220 mil). Mais surpreendente ainda é que o número de espécies desconhecidas pode ser 10 vezes maior! Exemplos exuberantes de vida marinha são os microscópicos fitoplâncton, os coloridos corais, os temidos tubarões e as gigantes baleias. Porém, toda essa vida está ameaçada diante das atividades predatórias e inconsequentes de uma única espécie, o ser humano.



Exemplificação da diversidade marinha, desde os microorganismos até os gigantes dos mares. A) Fotografias feitas em microscópio ótico para exemplificar diferentes espécies constituintes do fitoplâncton e do zooplâncton. Da esquerda para direita, de cima para baixo observa-se uma diatomácea cêntrica multipolar, um cocolitoforídeo, uma diatomácea do gênero Triceratium e um zooplâncton ciliado da ordem Tintinnida. B) Um exemplar in situ do coral invasor Tubastraea tagusensis no litoral do estado do Rio de Janeiro com os seus tentáculos amarelos (designação do nome popular coral-sol) abertos utilizados para alimentação. C) Um tubarão limão Negaprion brevirostris nas águas quentes do Arquipélago de Fernando de Noronha nadando próximo ao leito marinho repleto de algas calcárias e invertebrados sésseis e sedentários e D) um representante de baleia franca Eubalaena australis fazendo um salto exuberante na águas geladas da Patagônia argentina. Fotos: Humberto Fortunato ©.



QUAIS SÃO OS MEDOS E AS CURIOSIDADES SOBRE O MAR?


Esta pergunta foi feita para colegas cientistas e leigos com o objetivo de aproximar o público geral do objeto de estudo, o mar. Após um filtro, respostas referentes ao medo do desconhecido, o medo de ser atacado por algum animal, a curiosidade sobre a diversidade de espécies, formas e tamanhos e a preocupação com a poluição ganharam destaque.


O medo do desconhecido


O medo do desconhecido, de sofrer um ataque ou ser envenenado por um organismo marinho foi o primeiro comentário sobre o mar. Este medo é compreensível, devido ao baixo conhecimento que temos acerca da vida marinha, adicionado ao alarmismo jornalístico referente aos “perigos” do mar. A verdade é que grande parte destes ocorridos são acidentes casuais.


Um relatório desenvolvido pelo Arquivo Internacional de Ataques de Tubarões apontou que devem ocorrer entre 70 e 100 casos de ataques de tubarão por ano em todo o mundo e que este número é quase cinco vezes menor do que os ataques de cachorros aos humanos. Além disso, o número de banhistas e os tipos de uso do mar só aumentam, enquanto que os habitats marinhos diminuem. Assim sendo, o aumento no número de ataques decorre da diminuição do habitat dos animais, por uma questão de defesa ou pela confusão quanto ao tipo de presa. Portanto, tubarões não predam, não se alimentam de humanos. Os trágicos ataques são meramente acidentais.


Estima-se, também, que 20% das 90 espécies de tubarões que ocorrem no litoral brasileiro estejam ameaçadas de extinção. Se os dados forem similares ao redor do mundo, isso pode gerar uma crise ecológica e comercial em escala global, pois os tubarões compõem o topo da cadeia alimentar, mantendo o equilíbrio de diversas populações marinhas, inclusive as utilizadas na pesca.


Invertebrados marinhos também são comumente vistos como ameaças à saúde humana. O risco aos humanos pode ser evitado ou diminuído utilizando calçado apropriado nos costões rochosos para evitar corte por corais, equinodermos e moluscos. Grande parte dos organismos sésseis ou sedentários (aqueles que ficam fixos ou se movem pouco nas rochas e na areia) possui uma estrutura corporal dura, para impedir a perda de água, e capacidade de produzir toxinas que funcionam como defesa contra predadores e também competidores. Portanto, a melhor forma de prevenir qualquer acidente no ambiente marinho é ter atenção e não manusear os organismos.


A diversidade marinha


O segundo fato a chamar atenção dos humanos é a alta diversidade de espécies distribuídas no mar. A gama de diversidade de espécies, formas e tamanhos nos oceanos está diretamente relacionada ao fato deste ambiente ter sido o berço da vida no planeta, há 3,8 bilhões de anos. Segundo registros fósseis, os animais mais antigos ainda existentes são as esponjas marinhas (Filo Porifera), datadas com 650 milhões de anos. O segundo fator primordial para a alta diversidade de formas e tamanhos das espécies se refere à heterogeneidade de habitats marinhos, sendo temperatura, disponibilidade de luz, hidrodinamismo e tipo de substrato fatores estruturadores sobre as espécies.



À esquerda, um exemplar de porífero, a esponja barril Xestospongia muta, com mais de 1,5 m de altura. À direita, o átrio servindo de residência para diversas espécies animais. As fotografias foram tiradas nos recifes de coral da região Sudoeste da ilha da Martinica, no Mar do Caribe. Fotos: Humberto Fortunato ©.



Há uma impressão de que os organismos marinhos são muito grandes. Entretanto, a maioria das espécies marinhas possui tamanhos relativos aos dos seus parentes próximos terrestres. A grande exceção é com relação aos mamíferos marinhos.


Historicamente, acreditava-se que viver na água facilitaria o crescimento devido à menor pressão da gravidade, por exemplo. Porém, um estudo recente comparou a massa de milhares de espécies de mamíferos vivos e fósseis e indicou que a massa ideal para um indivíduo é de aproximadamente 500 kg. Ou seja, é bom ser grande no mar, mas não tão grande. O estudo aponta que este tamanho e massa são necessários para minimizar a perda de calor e necessidade de buscar alimento.


Por outro lado, organismos microscópicos também são abundantes e extremamente importantes para a saúde do planeta. Dentro deste grupo de organismos se encontra o fitoplâncton, pequenas algas que são os principais produtores de oxigênio do mundo. A cada duas respirações dadas por um indivíduo, uma delas é graças ao fitoplâncton!


A poluição ambiental e os seus efeitos


O terceiro ponto levantado está relacionado à poluição e como esta pode afetar os oceanos e a nós. O primeiro ponto a ser levado em consideração é de que a Terra passa por ciclos adversos há bilhões de anos e a natureza se transforma. A partir disso, as espécies se adaptam e permanecem vivas ou se extinguem. O ponto chave é que nos últimos 100 anos a espécie humana tem acelerado as mudanças no ambiente, causando malefícios em escala global e, em alguns casos, irreversíveis. Porém, a natureza já deu provas de que pode se reestruturar ao longo do tempo. Já o ser humano está fadado a desaparecer.


Dois tipos de poluição estão em voga: as mudanças climáticas referentes à emissão excessiva de gases do efeito estufa e os plásticos nos oceanos. Os dois tipos de poluição são extremamente agressivos ao planeta e devem ser tratados com a mesma sensibilidade e responsabilidade. A produção e o despejo de gases e plásticos precisam ser drasticamente minimizados. Enquanto a emissão dos gases aumenta a temperatura e acidez no mar, causando a morte de diversas espécies, já se sabe que daqui a 20 anos haverá mais plástico do que peixes nos oceanos. Os gases e grande parte do lixo que chegam ao mar produzem toxinas que entram na cadeia alimentar e atingem o ser humano. Assim, o não tratamento do esgoto, o despejo inapropriado, o excesso de material produzido sempre cai no mar e retorna, como doença, para o ser humano.


Diante das informações acima, três conclusões podem ser tomadas: 1) o oceano ainda é o maior enigma da Terra, 2) a natureza e as espécies se adaptam às mudanças no planeta, 3) se não mudarmos os nossos hábitos hoje, a nossa espécie não persistirá por muito tempo. Por mais melancólica que a mensagem possa parecer, ainda há tempo de modificar nossa atitude e usufruir deste mundo de possibilidades, de aventuras e de conhecimento que são os oceanos.



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Bibliografia


Costello MJ, Coll M, Danovaro R, Halpin P, Ojaveer H, Miloslavich P (2010) A census of marine biodiversity knowledge, resources, and future challenges. PLoS ONE 5. DOI: e12110. doi:10.1371/journal.pone.0012110


Gearty W, McClain CR, Payne JL (2018) Energetic trade-offs control the size distribution of aquatic mammals. Proceedings of the National Academy of Science of the United States of America 115:4194-4199. DOI: 10.1073/pnas.1712629115


Gustafson C, Key K, Evans RL (2019) Aquifer systems extending far offshore on the U.S. Atlantic margin. Scientific Reports 9. DOI: 10.1038/s41598-019-44611-7


Haddad-Junior V (2008) Animais aquáticos potencialmente perigosos do Brasil: Guia médico e biológico. Editora Roca, São Paulo, 288 p.


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