Autores: Fernanda Cabral Jeronimo, Raphaela A. Duarte Silveira, Thais R. Semprebom e Douglas F. Peiró
As florestas não são as únicas responsáveis pela absorção do CO2 atmosférico. Na verdade, o fitoplâncton é o grande protagonista. (A) Bioma amazônico e (B) Fitoplâncton. Fonte: (A) Ana Dayse/Wikimedia Commons (CC BY-SA 4.0) e (B) NOAA MESA Project/ Wikimedia Commons (CC0).
A vasta extensão do território brasileiro possibilita a existência de diferentes climas e, consequentemente, diferentes biomas. Dentre eles, estão as florestas tropicais, como a Floresta Amazônica e a Mata Atlântica.
As florestas tropicais são ambientes úmidos e quentes. Além de abrigar grande variedade de espécies animais, sua cor e exuberância provêm da sua flora. Dentre a grande biodiversidade da parte vegetal estão árvores de grande e médio porte, (como o pau-brasil e o jacarandá), plantas epífitas (desenvolvem-se sobre as demais plantas), por exemplo as bromélias e as orquídeas; além de arbustos e gramíneas.
Tamanha variedade vegetal em um mesmo local, com toda a certeza, também é responsável por uma fotossíntese em larga escala, já que as plantas são organismos autotróficos, ou seja, sintetizam o próprio alimento. E, embasado nessas circunstâncias, em 1971 surgiu um mito de que a Amazônia seria o "pulmão do mundo", por realizar trocas de gases com a atmosfera por meio da fotossíntese, disponibilizando o oxigênio, O2, para todas as outras formas de vida que consomem o gás oxigênio atmosférico para produzir sua energia, incluindo as próprias plantas e os seres humanos.
De fato, as plantas terrestres fixam uma grande quantidade de dióxido carbono, CO2 (cerca de 52 milhões de toneladas métricas ao ano) e, como consequência da fotossíntese, liberam O2 como resíduo. No entanto, as plantas também respiram, utilizando praticamente todo o O2 produzido na fotossíntese e por consequência liberando o gás carbônico residual.
Mas você sabia que os oceanos abrigam alguns organismos que geram uma grande quantidade de O2 (maior quantidade do que consomem) e são imprescindíveis para a manutenção de gases na atmosfera?
ORGANISMOS QUASE INVISÍVEIS, MAS IMPRESCINDÍVEIS
Mesmo que invisíveis a olho nu, o fitoplâncton (como exemplo: algas unicelulares, cianobactérias e dinoflagelados) habita cerca de ¾ da superfície do planeta e desempenha importante papel na manutenção da atmosfera terrestre. Essa afirmação pôde ser mensurada a partir de observações de satélites feitas pela NASA e realizadas desde 1997, onde foi possível acompanhar a comunidade planetária de fitoplâncton semanalmente.
A partir daí, tornou-se viável quantificar e comparar a produção primária do fitoplâncton e das plantas terrestres. Com isso, constatou-se que os oceanos retiram da atmosfera praticamente a mesma quantidade de CO2 do que todas as plantas terrestres juntas (45 a 50 toneladas métricas).
Os diferentes tipos de organismos constituintes do fitoplâncton. Iniciando à esquerda, têm-se as cianobactérias, diatomáceas, dinoflagelados, algas verdes e cocolitóforos. Fonte: NASA Earth Observatory/Wikimedia Commons (CC0).
MAS COMO ISSO É POSSÍVEL?
Devido ao seu curto ciclo de vida, o fitoplâncton fixa o carbono e canaliza a energia para a reprodução e para mais fotossíntese. Esses organismos se dividem em média a cada seis dias e a substituição da população pode levar cerca de uma semana. A respiração não faz parte de seu processo de geração de energia, portanto, o único resíduo é o gás oxigênio.
Em contrapartida, o consumo das células mortas de diatomáceas e algas unicelulares por micro-organismos possibilita a reciclagem de substâncias, como o CO2. O gás carbônico é, então, novamente disponibilizado no ambiente para ser usado como substrato em novos processos fotossintéticos, gerando mais oxigênio de forma mais rápida.
Tamanha atividade fotossintética permite uma importante troca de CO2 e O2 entre oceano e atmosfera. Dessa forma, 6 anos são suficientes para trocar completamente o volume de gases da atmosfera com os gases presentes na camada mais luminosa do oceano.
Portanto, o título de "pulmão do mundo" pertence aos oceanos, mais especificamente ao fitoplâncton, pois eles disponibilizam muito mais gás oxigênio para a atmosfera do que as florestas tropicais e plantas terrestres.
Imagem de satélite de um bloom de fitoplâncton na porção norte do oceano Atlântico, representada pela névoa azul. Fonte: NASA/Wikimedia Commons (CC0).
Além de seu papel fotossintético, o fitoplâncton é a base da cadeia alimentar oceânica. Ele serve de alimento a diversas espécies maiores, como o zooplâncton (animais planctônicos) e os peixes que, por sua vez, são parte da alimentação de milhares de outras espécies que, interligadas, formam uma rede alimentar muito importante para os ecossistemas.
A IMPORTÂNCIA DA CONSERVAÇÃO DOS BIOMAS FLORESTAIS
Não é porque o mito "pulmão do mundo" foi derrubado que as florestas tropicais não merecem destaque. Esses ecossistemas possuem uma variedade impressionante de espécies animais e vegetais, ajudam a regular as chuvas devido à grande taxa de evapotranspiração, impedem a erosão do solo, realizam a ciclagem de nutrientes, provêm alimentos e medicamentos e, também de forma muito contundente, atuam como reguladoras do clima em todo o globo terrestre (podendo ser apelidadas de “ar condicionado do mundo”, em substituição a “pulmão do mundo”).
Dessa forma, a preservação das florestas tropicais, dos oceanos e de quaisquer outros ecossistemas é de extrema importância, pois se relacionam diretamente com a vida. O ser humano e as demais espécies dependem dos serviços ecossistêmicos desses biomas para sobreviver.
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Bibliografia
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